É o tempo. Sempre urgente e implacável. Tempo que escraviza através das suas mais
diversas exigências, e, ao mesmo tempo impõe o questionamento dos valores e da ética -
frente a um mundo globalizado e sem fronteiras.
Na contemporaneidade, a estetização do
corpo passou a ser lei, pois dá ao individuo o sentimento de reconhecimento e pertença ao
grupo, garantindo-lhe a sensação de um permanente estado de felicidade. As relações, após o
surgimento da rede mundial de computadores (Internet), passaram a ser, também virtuais.
Entretanto, de forma contraditória, a sociedade do final do século XX vive um paradoxo entre
a globalização e o individualismo. É justamente neste espaço que a solidão se impõe.
Na clínica, na música, na escultura, declamada em prosa e verso, projetada na tela do
cinema, a solidão está presente nas mais diversas formas de expressão. Mais do que um estado
ou um sentimento, a solidão está inscrita na história do homem .
Na atualidade o homem vivencia a solidão de maneira complexa. Segundo Sennett
(em Tanis, 2003 p.29): “Existe a solidão que transcende os termos do poder, baseada na ideia de que há diferença entre estar só e sentir-se só. Esta solidão é expressa na sensação de estar
só entre muita gente...”
A solidão assume um caráter polissêmico. Pode ser uma força necessária que
possibilita a criação artística, também razão de sofrimento pelo seu caráter excludente. Para
alguns teóricos, é imprescindível vivenciá-la, principalmente para que haja o reconhecimento
do outro.
A clínica psicoterápica, enquanto espaço de escuta, é um dos lugares em que as
múltiplas modalidades da solidão podem ser verbalizadas e trabalhadas abertamente, através
da relação paciente-terapeuta.
Os significados da solidão são modificados ao longo da história, e estão ligadas a
mudanças subjetivas de cada época. Contudo, a solidão é inerente ao ser humano, desde seus
primórdios. A história costuma lhe conceder diferentes sentidos que ora assumem, caráter
positivo, ora, negativo, variando de acordo com os valores culturais, subjetivos de cada
tempo.
Através dos meios de comunicação de massa, passa-nos a ideia da felicidade pela via
da relação perfeita, idealizada. Os olhares dispensados aos indivíduos que, por opção ou
contingência, vivem só, na grande maioria são “patologizantes” ou excludentes, por estarem
estes sujeitos fora do grande circuito imposto pela mídia.
Alguns sentimentos, como a solidão, despertam dificuldades
ao vivê-los, assim como num determinado momento pode-se
ter a sensação de mal-estar que invade e origina uma percepção
de rejeição ou baixa autoestima e uma não apreensão do vazio
existencial. Este artigo tem como objetivo abordar os temas da
solidão e do vazio no cotidiano. A convivência social leva o homem
a uma postura que nem sempre é a sua preferência. Muitas
vezes, este homem se aliena de si mesmo o que pode acarretar
um vazio e uma ideia de incapacidade para fazer algo de ativo
sobre sua própria vida e sobre o ambiente em que vive.
O desejo pessoal parece estar subjugado diante da opinião
pública. A convivência sobrepõe normas que desencadeiam a incapacidade
de aceitá-las, produzindo uma angústia e apatia diante
do querer particular. Surge a alienação, que é sinônimo de solidão
e é uma característica do homem atual.
O ficar só é assustador quando é sentido como um isolamento,
o “medo da solidão” passa a ser uma ameaça quando
essa não é concebida como um valor positivo. Percebe-se que
a falta de convicção em relação ao que se deseja e o que sente
diante de uma situação traumática podem gerar uma reação de
procurar outras pessoas em busca de apoio e de orientação. O
outro e a ausência dele têm um papel importante na existência.
O homem contemporâneo sofre uma desesperança, que se
apresenta por várias facetas de sofrimento. A ausência do Outro é um
dos maiores fantasmas dessa realidade. Segundo Angerami-Camon:
“A solidão é, assim, a configuração extremada da ausência do Outro.
O Outro que se torna presente pela própria ausência configura em
meu ser sua necessidade”.